A Matemática está em tudo, menos entre nós.
A
Matemática é comumente vista como uma das ciências mais distantes da realidade
sensível e a que, particularmente, não se acanha em dificultar seu entendimento
aos estudantes. Suas fórmulas complexas, sua lógica particular, a maneira como
essa se constitui como sistema de práticas. Definitivamente, o imaginário do
senso comum se vê incapaz de se dedicar ao estudo dessa ciência. Nesse
contexto, o ensino da Matemática no Brasil se tornou uma tarefa não muito
fácil. Ultrapassar as barreiras que estigmatizam essa ciência, para o conjunto
de formadores que atuam na área, trata-se de um grande desafio. No intuito de
melhorar a percepção das pessoas em relação a essa área do conhecimento e de
facilitar o trabalho docente, exemplos como o da UFSB que proporciona aos
alunos de 1ª ciclo aulas de Matemática com o foco no cotidiano e espaço que a
acolhem, foram desenvolvidos e são geralmente bem vistos e entendidos como
alternativas viáveis à problemática. Mas, surge a questão: como fazer isso?
Certa
vez, Mário Sergio Cortella disse que a Matemática é a mais humana das ciências.
Nesse sentido, afirmar-se que, por conta que não é possível ver um número 1
indo às compras ou bater um papo com uma equação de 2º grau, as ciências exatas
são pura invenção humana. Dessa forma, a UFSB acerta em cheio quando propõe aos
seus discentes conteúdos obrigatórios da área das ciências exatas que, no
entanto, não se dedicam a exemplificar cálculos, mas sim a tratar de quais
foram os motivos pelos quais esses cálculos foram criados. A História,
Geografia e até a Antropologia podem, de maneira interdisciplinar, contribuir
com o proposito da humanização da Matemática. Assim, buscam-se elementos da
cultura Maia, Egípcia, Chinesa, Bora, entre outras para dizer afetuosamente ao
estudante de qualquer área ou tipo de graduação que é possível ver as ciências
exatas como se vê a sobremesa mais querida ou o galã da TV mais desejado. Portanto,
tais práticas de ensino-aprendizado são a armadura e coragem necessárias para
se enfrentar os preconceitos e estigmas construídos na sociedade brasileira em
torno das exatas.
Entretanto, se por um
lado existe iniciativa e um respeitável planejamento e embasamento teórico na
proposta da UFSB, a substância e consistência contextual ainda deixam a
desejar. Nesse sentido, a necessidade de politizar a educação é urgente, mesmo
quando não se percebe com clareza o que deve ser problematizado ou, ao menos, o
porquê. Se se pretende aproximar realmente o estudante e a Matemática dentro
das atividades acadêmicas, qual o motivo de fazer isso coletando elementos de povos
distantes física, cultural e temporalmente? Alguns afirmam que as experiências
com práticas e saberes de outras culturas e de outras comunidades ajudam na
construção do pensamento crítico e inovador, “fora da caixa”. No entanto, além
do fato de que despertar criticidade e inovação não significa explorar
conteúdos aleatórios, percebe-se que indagações acerca da utilidade dos assuntos
trabalhados nas aulas de Matemática persistem, mesmo quando se pretende
(ironicamente) desconstruir estigmas e preconceitos em torno dessa ciência.
Partindo desse ponto de vista, conclui-se que a proposta de indicar o estudo,
na perspectiva das Exatas, de comunidades antigas e distantes se sustenta como
interessante, mas é sabotada por sua própria estrutura metodológica quando
aplicada numa universidade que se responsabiliza para com o espaço e cotidiano
em que se encontra.
Sem dúvidas, romper com as barreiras construídas com cuidado pelo senso
comum que moldam a Matemática como uma ciência especialmente diferente e complicada
não se trata de um fácil desafio. A UFSB, universidade fortemente influenciada
por patronos da educação, a exemplo de Paulo Freire e Anísio Teixeira, tem
certamente dificuldades em implementar, junto a comunidade acadêmica, o
conjunto de diretrizes norteadoras que ajudam a diminuir os estigmas em torno
das ciências exatas. Nesse contexto, além dos relevantes esforços existentes na
universidade sul baiana, deve existir um constante desejo de autorreflexão
acerca da compatibilidade do projeto executado para com aqueles que são
diretamente afetados, os estudantes. Dessa maneira, mais do que informar sobre
como as comunidades estruturam/estruturaram suas formas de perceber a
Matemática e provocar eventualmente a criatividade e inovação, é preciso pensar
junto ao contemporâneo, suas necessidades, desejos e pessoas que vivem neste
tempo.
Caro Eugênio: concordo contigo em, praticamente, todo o teor de teu post. Mas acredito que a apresentação da matemática praticada no cotidiano de civilizações distantes, no tempo e no espaço, pode ajudar à formação dos estudantes ingressantes na UFSB, que chegam ao ensino superior, como sabemos, vindos de realidades formativas que resultam em conhecimentos muito aquém do que seria desejado para a continuidade de seu percurso formativo. Isso é necessário por hora, quer seja para atender os objetivos acadêmicos, quer seja os profissionais, de forma interdisciplinar, conforme apregoamos na UFSB. Tuas observações são muito importantes para mim. 1 abraço.
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